Valdyr Perrini
Situações extremamente adversas, como a que vivemos hoje no Brasil nesses tempos sombrios de pandemia do Coronavírus, costumam aguçar dois sentimentos peculiares e antagônicos.
Por um lado acentua-se a solidariedade em favor dos menos favorecidos, inspiradora de campanhas de arrecadação de artigos de primeira necessidade correlatos à higiene e à sobrevivência.
Por outro exacerba-se o sentimento egoísta de tirar proveito da crise e da fragilidade econômica, jurídica e emocional dos hipossuficientes. Consumidores e empregados propriamente ditos ou travestidos da fantasiosa insígnia de “autônomos” ou de “colaboradores empreendedores” estão à mercê dessa exploração.
As instituições de ensino privado, lamentavelmente pontificam nesse segundo grupo, com honrosas exceções que confirmam a regra.
Aproveitando-se do isolamento social que se estende por toda a sociedade, as instituições de ensino privado de Curitiba e da Região Metropolitana tem encaminhado pela via eletrônica para os professores aditamentos de contratos de trabalho leoninos que privilegiam a condição já vantajosa do empregador. Por ocasião do encaminhamento destes contratos os docentes são “convidados” a promover o “aceite eletrônico” das novas condições impostas sem qualquer espécie de negociação.
Os que hesitam aceitar passivamente as imposições recebem um nem sempre cordial telefonema do Coordenador do Curso indagando as razões da recalcitrância e lembrando que a fila de docentes desempregados aumenta diariamente.
Quatro pontos tem sido lugar comum nesses aditamentos contratuais: previsão expressa de não pagamento de horas extras; transferência da responsabilidade pelos custos do trabalho domiciliar ao empregado; cessão gratuita de direitos autorais e de imagem e exigência de que, além das aulas presenciais, o professor deverá disponibilizar material audiovisual gravado nos diversos portais das instituições de ensino superior.
A ilicitude de cada uma dessas cláusulas, assim como de atrasos no pagamento de verbas salariais “ajustados” por meio de aditamentos, que já começam a aparecer, será objeto de exame pormenorizado em breve.
Por ora, importante se ater aos defeitos que maculam a manifestação de vontade do professor que “aceita” as condições que lhe são impostas.
Presente em cada um dos aditamentos de contrato que são enfiados goela abaixo dos docentes com a “ajuda” do telefonema do Coordenador vício do consentimento denominado coação. Coação consiste, segundo o artigo 151 do Código Civil em conduta patronal capaz de incutir “fundado temor à pessoa coagida… ou aos seus bens.”
Simultaneamente à coação, outro defeito do ato jurídico de concordância a esses inescrupulosos aditamentos faz-se presente. Trata-se da lesão subjetiva, regulada pelo artigo 157 do Código Civil, que ocorre quando “uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.”
Não há duvida que esses aditamentos estabelecem prestações manifestamente desproporcionais em favor do empregador. Em troca da mesma remuneração que vinha sendo recebida pelo ensino presencial potencializam-se os deveres dos docentes e ainda por cima exige-se renúncia a importantes direitos.
Com o intuito de auxiliar os docentes na comprovação dessas irregularidades e invalidar esses aditamentos contratuais em questão, o Sinpes oficiou o SINEPE e as principais instituições de ensino, solicitando dos empregadores que celebraram aditivos contratuais a indicação de “como a negociação está sendo feita com os professores, bem como apontar eventuais alterações na proposta original apresentada aos docentes porventura efetivada em face desta negociação.”
O teor do ofício, o silêncio eloquente dos empregadores e da entidade sindical patronal a respeito destes ofícios, assim como eventuais respostas evasivas ficarão à disposição dos professores interessados, para servir como provas adicionais da coação e da lesão subjetiva perpetradas pelos inescrupulosos empregadores, facilitando assim a invalidação dessas medidas.
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